“A nossa vida foi assim: uma luta. Aprendi a fazer renda com a minha mãe, trabalhava pra ajudar os pais. Luz de querosene, eu botava uma almofada de bilro aqui na minha frente, à noite. Durante o dia, ia pra chácara apanhar café com minha mãe. Ela era apanhadeira de café e cantava muita música, muita ratoeira, sempre gostou de cantar. A chácara da mulher, [onde trabalhávamos], tinha bastante fruta: laranja, bergamota, goiaba. – Se estiverem com fome, vocês podem pegar uma frutinha pra comer. E nós trabalhando, a vida inteira.”
Ivonira Julieta da Silva,
rendeira da Ilha de Santa Catarina.
Entrevista realizada em 30 de outubro de 2018 no Ribeirão da Ilha, Florianópolis - SC
POR TATI COSTA E DANIEL CHOMA | ACERVO: CÂMARA CLARA
IVONIRA – Nasci no Ribeirão da Ilha mesmo, sou nativa daqui. Minha mãe é desse local aqui, da Freguesia. Meu pai já é lá do Alto do Ribeirão, mais pra frente um pouco, onde fica o Bandeirante. Os dois se namoraram, se casaram, meu pai – naquela época não tinha emprego -, ele era pombeiro, pessoal antigo dizia que era pombeiro.
Ele vinha aqui na Freguesia, pegava quantidade de peixe, enfiava tudo numa vareta e levava lá pro Alto Ribeirão, para o pessoal comprar lá. Até depois ele se organizar a pegar um trabalho, porque não era Base, não era Aeronáutica, era Aviação. E essa Aviação quando veio pra cá empregou muita gente. O que teve e o que tem aqui foi através da Aviação.
Eles foram trabalhar, era estrada de chão e minha mãe trabalhava fora com uma senhora que o marido era da Marinha. Mas também ela não tinha emprego, tadinha, ela fazia renda à noite e durante o dia ela ia pra casa da moça, fazia renda com ela lá, pra servir de companhia. Naquela época era assim. Depois, quando chegou um certo tempo, o pessoal começou a procurar emprego porque a Aviação abriu aquele espaço.
Então naquele local, lá onde é o aeroporto, a Base Aérea, aquele pedaço ali, começou a abrir emprego pras pessoas, precisava de homens pra trabalhar. E esse moço que é o marido dessa amiga da minha mãe, ele botou todas as pessoas a trabalhar e minha mãe trabalhava com ela. No final da conta ele esqueceu de colocar meu pai na lista pra trabalho.
Aí quando chegou um dia minha mãe falou: – “Chiquinha vem cá, vou te fazer uma pergunta. O Criga – ele era um homem grandão, da Marinha – ele colocou todo mundo na aviação pra trabalhar. Eu como sou tua amiga e trabalho com você aqui…” Minha mãe ia pra lá, lavava roupa, fazia renda com ela e servia de companhia porque ela nunca teve filhos.
“- Meu marido ficou de fora. Preciso também que ele trabalhe porque como vou sustentar cinco filhos?” Nós cinco, éramos em três mulheres e dois homens. Ela disse: “- Julieta, meu Deus do céu, não posso esquecer de ti, tu não podes ficar de fora querida. Tá, quando o nego chegar…” Naquele tempo chamávamos assim.
“- Falo pra ver se tem uma vaga pro Procópio.” Era meu pai.
“- Porque ele não pode ficar de fora, ainda mais você, que está aqui na nossa casa de acompanhante comigo e o teu marido não arrumar trabalho, ele precisa.” Eram sete pessoas: minha mãe, meu pai e cinco irmãos. Quando ele chegou, cinco horas, ele vinha de bicicleta, não vinha de carro, ele vinha de bicicleta mas era muito barro, muita lama porque não era nada calçado naquela época, era estrada de chão batido…
Esta conversa continua!
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com a íntegra da entrevista com
Ivonira Julieta da Silva, ou clique aqui para baixar a Ficha de Entrevista com o resumo dos principais temas abordados.
Abaixo, vídeo com trechos do encontro.
Ficha Técnica Local da entrevista: Residência da entrevistada, Freguesia do Ribeirão da Ilha, Florianópolis - SC. Data: 30 de outubro de 2018. Participantes: Tati Costa (entrevista e captação de som); Daniel Choma (entrevista e câmera). Cleusa, filha de dona Ivonira, acompanha a entrevista. Projeto de origem: Ribeirão Foto Sensível. Parcerias do projeto Ribeirão Foto Sensível: Ecomuseu do Ribeirão da Ilha; Sociedade Musical e Recreativa Lapa; Conselho Comunitário do Ribeirão da Ilha; Grupo de Idosos do Conselho Comunitário do Ribeirão da Ilha; Escola Estadual EEB Dom Jaime de Barros Câmara; Paróquia Nossa Senhora da Lapa (Matriz da Freguesia do Ribeirão da Ilha); Casa da Memória – Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes; Setor de Coleções Especiais – Biblioteca Universitária – Campus Florianópolis – UFSC; Museu de Arqueologia e Etnologia Professor Oswaldo Rodrigues Cabral - UFSC; Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Superintendência em Santa Catarina; Fundação Catarinense de Cultura; Secretaria de Turismo, Cultura e Esporte - Governo do Estado de Santa Catarina; Secretaria da Cidadania e Diversidade Cultural; Ministério da Cultura - Governo Federal Produção projeto Ribeirão Foto Sensível (2018) e acervo: Câmara Clara – Instituto de Memória e Imagem. Transcrição da entrevista para projeto Memória Rendeira (2021): Tati Costa. | Editoração: Daniel Choma. Trilha musical do vídeo: Domingos de Salvi | Montagem: Daniel Choma | Pesquisa e Produção: Tati Costa Programação do site: André Bets