Dyego Violeiro

“A viola toca tudo.
A viola é, como diz o nosso grande amigo Aparício Ribeiro, a viola é a célula mãe da música caipira. E é bom lembrar disso: a viola toca tudo, desde o caipirão até rock, se quiser, a viola executa. Então, a nossa viola está de parabéns.”

Entrevista com o músico e construtor de violas Onicio Rosa da Silva (Dyego Violeiro), morador de Ceilândia-DF.

Encontro realizado na sua oficina de luteria, em Ceilândia-DF, dia 09 de fevereiro de 2018.
Entrevistadores: Domingos de Salvi, Sara de Melo, Daniel Choma e Tati Costa.
Transcrição: Tati Costa. Fotos e editoração: Daniel Choma.

Dyego Violeiro nasceu em Bom Jesus do Prata, Frei Inocêncio-MG, em 01 de maio de 1971.


Domingos: 
Você é natural de onde?

Dyego:  Eu sou de Minas Gerais, de uma corruptela chamada Bom Jesus do Prata. Um povoado bem pequenininho mesmo, no município de Frei Inocêncio, Minas Gerais. E sou registrado em Mathias Lobado, é uma cidade bem do lado. É um interiorzão bem roceiro mesmo, a nossa região. Cidadezinha onde meus pais residem até hoje, uma corruptelazinha daquelas bem pequenininhas mesmo, lugar bem gostoso.

Domingos:  Você nasceu na área rural?

Dyego:  É, eu nasci na área rural. Meu pai trabalhava em fazenda, eu nasci em fazenda. Aí sequencialmente a gente mudou pra essa corruptela onde eles residem até hoje. Meus parentes, meu irmão mais velho e meus pais, moram lá.

Domingos:  E lá você viveu até quando?

Dyego:  Lá eu vivi até meus 21 anos. E aos 21 anos eu vim pra Brasília. Mas lá a gente já tocava, meu pai e minha mãe cantavam. A história começou com o seguinte: meu padrinho de batismo tocava violão, meu pai e minha mãe cantavam naqueles bailes de roça, aquelas brincadeiras de roça. Meus irmãos mais velhos foram aprendendo com meu padrinho de batismo, aprendeu lá aquele violão da roça mesmo e foi crescendo. A gente foi aprendendo, todo mundo aprendendo com o outro, sem ninguém ensinar. Acho que já estava no sangue e acho que eu sempre fui o mais apaixonado por isso. A gente cantou muito tempo lá, eu mais com o meu irmão. A gente tinha uma dupla, dupla de criança. A gente cantou em comício, fez vários shows naquelas bandas lá. Depois que ele ficou adulto, veio pra Brasília – e eu também. Aqui eu conheci vários companheiros, sempre na música. Onde eu tive contato com a viola foi aqui em Brasília. Lá tinha viola, mas muito pouco. E aqui em Brasília, quando eu conheci a viola, foi aquela paixão. Parece que era aquilo que eu estava procurando.

Domingos:  E lá, você lembra se tinha Folias de Reis?

Dyego:  Tinha, tinha Folia de Reis, Folia do Divino. E tinha um pessoal de lá da cidade mesmo que fazia os giros lá nas roças, na cidadezinha, nas casas. A gente sempre teve essas coisas bem roceiras, bem próximo da gente. A gente às vezes participava, os amigos participavam, girava junto às vezes. Na época eu era um pouco criança, quando ainda tinha lá, mas eu me lembro muito bem que o pessoal ia e participava junto.

Domingos:  E dessa época, você tem a lembrança de ver a viola?

Dyego:  Não, eu tenho lembrança. Tinha um senhor chamado senhor Diolindo, era o senhor que mais tocava viola lá na região, inclusive acho que só era ele que tinha viola. E ele tocava nas Folias, às vezes eles saíam com a Folia, ele que tocava viola. Os outros batiam caixa, aqueles negócios e violão – e ele tocava viola. O que eu me lembro da viola assim lá na região, na época, na cidadezinha lá, é só o senhor Diolindo.  É o único que eu me lembro que tocava viola. Ninguém mais tinha contato com viola naquela época ali, naquela nossa regiãozinha nossa lá.

Domingos:  E quando você vem para Brasília, onde vai morar? Como foi a chegada?

Dyego:  Eu cheguei em Brasília no dia primeiro de maio, por coincidência dia do meu aniversário. Dia primeiro de maio de 1991. Eu fiz meus vinte e um anos viajando pra cá. E aí comecei a trabalhar. E tocando violão, que eu já tocava violão desde criança, desde os seis anos. A gente ficou amigo de um amigo do meu irmão, e tocava violão todo final de semana lá na casa dele. Ele falou assim, rapaz, se você conhecer o meu pai, meu pai toca viola, se você conhecer você vai ver o que é um velho que toca uma viola bonita. Eu fiquei louco e falei, cara, me mostra esse senhor logo, que eu quero entrar em contato, eu quero ver. O nome dele é Tião Violeiro, acho que já até falamos sobre ele. Aí no final de semana a gente foi lá dar um passeio lá e seu Tião me mostrou a viola. É aquela coisa… Sabe quando você bate o olho assim no instrumento? Você sabe como? Aí ele tocou, eu fiquei louco, fiquei apaixonado pelo instrumento, gostei demais, a gente cantou e tal. Aí ele falou: rapaz, compra uma viola pra você e vamos fazer aula, vamos estudar. Aí na outra semana já comprei uma viola. Eu não sabia nem afinar e levei lá, ele afinou pra mim e fiz aula com ele. Então meus primeiros acordes de viola, minha primeira topada mesmo com a viola foi com Tião Violeiro, ele que me instruiu, afinou, me ensinou a tocar. E aí a gente já tem aquele negócio da música no sangue, a gente vai deslanchando. E estamos aí, grudado até hoje. Aí não soltei mais não! [Risos.]

Domingos:  O seu Tião Violeiro morava onde?

Dyego:  Ele reside no mesmo local hoje, na QN J, aqui em Brasília, lá em Taguatinga Norte. Na época eu morava em Sobradinho. Aí eu vinha de lá aos finais de semana, ia lá só pra ele me passar alguma coisa. Depois que eu mudei pro P. Sul, aí eu comecei a fazer aula mais sequencial com ele.

Domingos:  E como era a questão da viola nessa época aí?

Dyego:  Eu conheci o seu Tião foi mais ou menos 1993, 92, por aí. Aquela época viola ainda era um pouco sumida, o povo tinha um preconceito maior. Hoje ainda existe um pouquinho de preconceito, mas o povo tinha um preconceito bem maior. Então era época que estava despontando Tião Carreiro e Pardinho, Zé Mulato e Cassiano, na época estava fazendo muito sucesso aqui em Brasília e no Brasil inteiro. E foi uma época muito boa pra apreender o instrumento, porque estava chegando com toda a força a viola. Apesar dos preconceitos eu achei que ela chegou com bastante força dessa época pra cá. E foi uma época boa porque o que eu aprendi, a gente está mostrando até hoje, entendeu? Então está valendo até hoje. Dessa época pra cá todo mundo conseguiu mostrar mais o trabalho de viola, de violeiro, de música caipira em geral, de regional. E foi muito legal, está sendo assim muito especial até hoje pra mim.

Domingos:  E de professores de viola, fora o seu Tião, tinha outras pessoas?

Dyego:  Olha, na época, o seu Tião é um dos pioneiros aqui de professor de viola. Na época só tinha o seu Tião Violeiro e o Reis Moura, que eram os mais conceituados aqui. E o Roberto Corrêa naquela época também já estava dando aula, já estava pesquisando, já estava na ativa. Mas os mais assim, no gênero bem caipira, é o Tião Violeiro e o Reis Moura, na época. Eram os mais cotados aqui, os que mais se ouvia falar, entendeu? A gente ouvir falar de professor era o Tião Violeiro e o Reis Moura. Aí depois foi aparecendo mais gente mostrando trabalho, mais professores, mais interessados.

Domingos:  E nesse período você foi formando duplas caipiras também?

Dyego:  Depois que eu aprendi a viola, fiquei um bom tempo tocando, aprendendo. E quando foi em 1999 eu fiz a minha primeira dupla aqui em Brasília. Cantava sozinho por aí nas festinhas e tal. Às vezes até dava uma canjinha em algum local. Em 99 eu fiz uma dupla, foi Dyego e Karley Uma dupla que destacou bastante, na época a gente chegou mostrando trabalho novo. E que a gente foi conhecer mesmo o mundo da viola, o Karley já era veterano na música assim. Embora viola mesmo assim não era o estilo que ele tinha, que ele cantava e tal. Mas aí eu cheguei com ele, a gente fez um repertório legal, a gente mesclava umas músicas tipo Trio Parada Dura, Gino e Geno, e colocava um repertório da viola também. O pessoal gostava, a gente fazia tudo isso de viola, fora os modão caipira mesmo. Essa dupla durou até 2007, nós gravamos dois CDs, um CD chamado “Saudade de Minas Gerais” e o nosso último trabalho “Coração não manda em mim”. A gente considera nosso cartão de visita e que mostrou a nossa cara mesmo, de Dyego e Karley. E “Coração não manda em mim” foi nosso último trabalho. Aí ele resolveu parar, aí eu fiquei um tempo sem tocar na ativa.

Eu comecei a tocar baixo pro Vanderley e Valtecy, pro Zé Mulato e Cassiano, na época a gente era muito amigo e tal… E nos ensaios do Vanderley e Valtecy eu conheci o Gustavo. O Gustavo tocava com eles, fazia violão dobrado com eles lá e a gente conheceu. Aí eles falaram: “olha, pra você não ficar parado, Dyego, vai cantando umas modas mais o Gustavo aí, brincando aí”. A gente começou a cantar, foi crescendo aquele interesse e todo mundo percebeu que estava um timbre gostoso, de vozes assim, de violeiro, aquele entrosamento gostoso, aquele entrosamento legal pra moda caipira. E a gente foi ensaiando, ensaiando, aí um dia o pessoal cobrou: vocês tem que fazer uma dupla, a dupla está muito boa. Aí eu falei não, de repente não é isso que o rapaz quer e tal. Aí a gente foi dando um tempo assim, tocando sempre, aí um dia ele pegou e me chamou, falou: “olha Dyego, se você quiser a gente faz uma dupla mesmo, assim, pra oficializar mesmo, assim: Dyego e Gustavo. O que você acha?” Eu peguei, expliquei, falei: “olha, o negócio é o seguinte, eu gosto de música caipira, eu gosto de viola, é isso que você quer? Talvez não seja esse o caminho que você está querendo”… Na época ele era novinho, tinha quinze pra dezesseis anos, ele falou: “não, é isso mesmo que eu quero, eu gosto de viola, carreira que eu quero seguir é como violeiro, repertório totalmente caipira, raizão mesmo assim”. Falei: “tá, então vamos, a gente vai trabalhando, vamos vendo o que dá”. E hoje, graças a Deus temos um bom tempo que a gente está junto tocando viola. A gente faz show pelo Brasil e programas de TV, rádio… A gente já tem um nome bem conhecido, graças a Deus. Estamos gravando agora nosso primeiro CD, pelo FAC, é bom lembrar isso. A gente já está terminando e daqui um mês, um mês e meio, esse CD está chegando por aí. E está aí a cara do Dyego e Gustavo, bem sertanejão, bem caipirão. Estamos junto aí.   (Continua…)