
“Com sete anos, já fazia renda pra comprar tamanquinho ou um vestidinho de chita. Aí me casei e sempre fiz renda pra enxoval e tudo, fazia muita renda. Quando era de julho a outubro ia pra esses morros apanhar café. Nesse período, só fazia renda à noite, com luz de querosene. De madrugada, quando meu irmão botava os bois pra trabalhar, pra fornear, fazer a farinha, eu me levantava pra adiantar o serviço. Depois então nós íamos apanhar café.”
Dealtina Catarina de Oliveira,
rendeira da Ilha de Santa Catarina.

Entrevista realizada em 24 de abril de 2013
na Armação do Pântano do Sul, Florianópolis – SC
POR TATI COSTA E DANIEL CHOMA | ACERVO: CÂMARA CLARA

DEALTINA – Meu pai plantava cana, plantava feijão, isso tudo pra gente ter para nosso gasto, porque naquela época a vida era tão difícil. Ele também trabalhava de carpinteiro, pedreiro, fazia engenhos, tem muito aqui na região. Fez muitas casas…. E ele trabalhava também na lavoura onde plantava, fazia açúcar, farinha, isso era do gasto. Era assim: fazia açúcar, qualquer coisa, vinha um pessoal, ele dava melado, açúcar, tudo ele dava.

TATI – Vocês tinham alambique e o engenho pra fazer o açúcar?
DEALTINA – Sim, tinha engenho pra fazer açúcar. Depois meu irmão montou um alambique, mas por pouco tempo também… [Comenta sobre fotografia] Isso aqui, raspando mandioca, a gente fez muito, raspamos muita mandioca. Foi uma vida boa.

TATI – Era bem assim como essa foto representa?
DEALTINA – Era assim, mas o engenho do meu pai era um engenho bem amplo, ele mesmo fazia, era um engenho bom, bem bonito por dentro. A gente fazia beiju, a rosca de massa, tudo isso a gente fazia, sentava pra raspar mandioca.

TATI – A senhora nasceu aqui?
DEALTINA – Nasci aqui, bem onde hoje tem casa ali. Esse terreno todo era do meu pai e fomos criadas aqui, uma infância boa naquela época. Brincava muito de correr, de se esconder, brincava de pular corda, bandeira, isso tudo nós brincávamos.

Foi uma coisa muito boa, só que foi difícil o estudo, porque tínhamos a professora, mas era bem pra lá, bem longe, sabe? Custávamos a ir porque era de pé e se chovia a estrada ficava aquele mar de água. Nós íamos pra aula e ia esperar as carroças que vêm do centro às quartas-feiras, a gente pedia carona.

Tinha um toldo e ali atrás é fechado, atrás da carroça tinha uma madeira mais comprida e nós ali sentávamos, mas era tudo agarrado uma na outra quando passava as poças d´água. Era muito distante, tinha que ser assim se não atolava, aí a gente chegava sequinha, dizia: obrigada!

Mas era assim, sabe? Brincava, fazia travessura. Mas depois, no fim, na quarta série, tínhamos um professor que até morava aqui e ele era separado da esposa, ela ficou com três filhos, deixou ele por causa da pinga. Ele já ia tonto pra dar aula. Isso era na aula de manhã, mas ele chegava ali no trevo, tinha uma venda, naquela época, ali ele tomava cachaça. Chegava lá bêbado, mas não ensinava nós. Olha, a gente saiu da quarta série incompleta, nem tiramos quarta série primária.

[Comenta sobre fotografia]
DEALTINA – A casa da dona Lúcia. Essa daqui, meu Deus do céu, a gente brincava em frente essa casa. Aqui era um pasto grande que tinha, então se formava aquele pasto mais alto e ali tinha aquelas valas. Quando dava chuva enchia e a gente pulava, falavam que era caldeirão. Pulava daqui ali, pra ver aquela que caía dentro da água, entende? Era assim, passava o dia todo aqui, mais ou menos pra cá.

Os cafezeiros, bananeiras… Meu Deus, quanto peixe nós comemos aqui, minha nossa, muito bom ter visto essa casa. Dá saudade porque essa senhora era tia do meu marido, mas era um doce de pessoa. Era velhinha e ela ajudava muito lá na casa da minha mãe. Quando minha mãe tinha os filhos ela ia pra casa, lavava roupa, era uma pessoa muito dedicada, coitada, muito querida mesmo. Depois foi muito bom. Essa casa era de fora a fora uma sala grande, tinha uma mesa onde eles comiam, tinha fogão à lenha…

Esta conversa continua!
Clique aqui para baixar o PDF
com a íntegra da entrevista com
Dealtina Catarina de Oliveira, ou clique aqui para baixar a Ficha de Entrevista com o resumo dos principais temas abordados.
Abaixo, vídeo com trechos do encontro.
Ficha Técnica Local da entrevista: Residência da entrevistada, Armação do Pântano do Sul, Florianópolis - SC. Data: 24/04/2013 Participantes: Tati Costa (entrevista e captação de som); Daniel Choma (câmera). Projeto de origem da entrevista: Foto Sensível Armação Parcerias do projeto Foto Sensível Armação (2013): Câmara Clara, Ponto de Cultura Baleeira - Instituto 3 Vermelho; FUNARTE; Mais Cultura, Cultura Viva, Secretaria da Cidadania e Diversidade Cultural, Ministério da Cultura, Governo Federal. Transcrição da entrevista para projeto Memória Rendeira (2021): Tati Costa. | Editoração: Daniel Choma. Trilha musical do vídeo: Domingos de Salvi | Montagem: Daniel Choma | Pesquisa e Produção: Tati Costa Programação do site: André Bets.